Várzea paulistana - Uma tradição se esvaindo
Hoje estou mais sério que o normal, justamente porque vou falar de uma realidade que me deixa, digamos, chateado.
Pra quem não sabe, o futebol varzeano é uma das maiores tradições desta cidade, desde a época em que Charles Miller, um almofadinha bigodudo, trouxe duas bolas da Inglaterra pra cá, no final do século retrasado após completar seus estudos na terra da rainha e organizar o primeiro jogo de futebol do Brasil: uma peleja entre funcionários da Gás Company e da São Paulo Railway, no longínquo ano de 1.895, na Várzea do Carmo (daí o nome varzeano), num enorme descampado que servia de pasto para vacas.
O esporte acabou se difundindo e apaixonando a todos. Com isso, inúmeros campos e times foram criados, da Várzea do Carmo para toda a cidade, principalmente nos bairros operários do centro expandido, como Bom Retiro, Penha, Brás, Ipiranga, Canindé, Barra Funda, Brás, Belém... Mesmo anos depois, o futebol varzeano continuou sendo o maior celeiro de inúmeros craques que iam para os times profissionais e até para a Seleção Brasileira. Até o Corinthians, meu time do coração, nasceu na várzea.
Embora seja importante conhecer a história, o que mais importa é a tradição do troço, uma das nossas maiores, que vêm sendo impingida por politicagens de poderosos, por corruptos que estão à frente das agremiações enchendo o bolso, por um tempo mais-que-desumano e mais dominado pelo capital, em que um terreno no centro da grande e triste cidade vale muito para ter “joguinhos” aos finais de semana e poderia ser uma bela fonte de renda e negócio...
A várzea tem, meus amigos, o espírito do futebol antigo, talvez morto quando decidiram separar torcidas no estádio e quando a bufunfa imperou sobre a paixão. É no nosso campo de fé que vamos jogar uma vez por semana e sentimo-nos, como nos delírios infantis, que o tal jogo vale como final de Copa do Mundo, e depois comentamos: “...viu meu gol?”, “... que drible que eu dei, hein!”.
Além disso, os clubes de várzea representavam seus bairros. Torcer por um time era uma demonstração de amor pelo seu bairro. E as rivalidades eram enormes, pois, como uma batalha, não eram apenas dois times se enfrentando, e sim qual bairro era o maior revelador de craques. E nessas batalhas, muitas vezes, o “pau quebrava”. Porrada pra todo lado, no tempo em que se meter em uma briga não era risco de morte. Na pior das hipóteses, hematomas pelo esqueleto...
Neste cenário o aprendizado vai muito além das quatro linhas. Nele há uma total convivência social, com pessoas de todas as classes sociais, com malandro e com bandido e com polícia, com trabalhadores e vagabundos, com acadêmicos e analfabetos. Ali, dentro de campo, com a mesma camisa, todos são iguais... Não há pose nem badalação. É um jogo de futebol. Inevitavelmente, 99% dos campos varzeanos têm um bar para, após o jogo, aquela cerveja gelada e um bom jogo de truco.
Mas como nem tudo são flores, a várzea vem, ano após ano, acabando. As pseudo-escolinhas de futebol (futebol não se aprende, porra!) e os societys espalhados como praga por todos os lados ajudam a acabar mais rapidamente com essa tradição tão característica, que na iminência do fim já se faz anunciar. Este infelizmente é um processo irreversível. Muitos campos já foram tomados pela prefeitura principalmente para programas duvidosos de moradia popular e esquisitas construções de empresas. Mas nós, no Anhanguera, ainda não seremos enterrados por essa avalanche, pois estamos nos adequando às exigências imperativas da prefeitura de uma sociabilidade mascarada em relação à comunidade (não entrarei em detalhes)...
É com uma mistura de tristeza e não-conformismo que recebi a notícia de que a aeronáutica irá “desapropriar” os cinco clubes (Pitangueira, Baruel, Paulista, Saad e Cruz da Esperança) que atualmente (desde 1.980) têm a concessão de uso de seu território. Ainda ninguém sabe se esta notícia é especulação ou não.
Aquele pedaço, no bairro da Casa Verde, talvez seja hoje (e digo talvez porque não conheço outro) o maior aglomerado de campos da várzea paulistana num mesmo espaço. São cinco campos independentes, um ao lado do outro, bem como era antigamente, com suas rivalidades e boa convivência. Eu, assim como os bons freqüentadores dos campos, já corri muito por lá, naqueles gramados.
Digo, em nome de minha pessoa, aos amigos da Casa Verde que ficarão órfãos de seus clubes e campos: Atravessem o rio Tietê e sejam bem chegados pra uma cerveja no Anhanguera. Pra jogar bola é outra história...
Pra quem não sabe, o futebol varzeano é uma das maiores tradições desta cidade, desde a época em que Charles Miller, um almofadinha bigodudo, trouxe duas bolas da Inglaterra pra cá, no final do século retrasado após completar seus estudos na terra da rainha e organizar o primeiro jogo de futebol do Brasil: uma peleja entre funcionários da Gás Company e da São Paulo Railway, no longínquo ano de 1.895, na Várzea do Carmo (daí o nome varzeano), num enorme descampado que servia de pasto para vacas.
O esporte acabou se difundindo e apaixonando a todos. Com isso, inúmeros campos e times foram criados, da Várzea do Carmo para toda a cidade, principalmente nos bairros operários do centro expandido, como Bom Retiro, Penha, Brás, Ipiranga, Canindé, Barra Funda, Brás, Belém... Mesmo anos depois, o futebol varzeano continuou sendo o maior celeiro de inúmeros craques que iam para os times profissionais e até para a Seleção Brasileira. Até o Corinthians, meu time do coração, nasceu na várzea.
Embora seja importante conhecer a história, o que mais importa é a tradição do troço, uma das nossas maiores, que vêm sendo impingida por politicagens de poderosos, por corruptos que estão à frente das agremiações enchendo o bolso, por um tempo mais-que-desumano e mais dominado pelo capital, em que um terreno no centro da grande e triste cidade vale muito para ter “joguinhos” aos finais de semana e poderia ser uma bela fonte de renda e negócio...
A várzea tem, meus amigos, o espírito do futebol antigo, talvez morto quando decidiram separar torcidas no estádio e quando a bufunfa imperou sobre a paixão. É no nosso campo de fé que vamos jogar uma vez por semana e sentimo-nos, como nos delírios infantis, que o tal jogo vale como final de Copa do Mundo, e depois comentamos: “...viu meu gol?”, “... que drible que eu dei, hein!”.
Além disso, os clubes de várzea representavam seus bairros. Torcer por um time era uma demonstração de amor pelo seu bairro. E as rivalidades eram enormes, pois, como uma batalha, não eram apenas dois times se enfrentando, e sim qual bairro era o maior revelador de craques. E nessas batalhas, muitas vezes, o “pau quebrava”. Porrada pra todo lado, no tempo em que se meter em uma briga não era risco de morte. Na pior das hipóteses, hematomas pelo esqueleto...
Neste cenário o aprendizado vai muito além das quatro linhas. Nele há uma total convivência social, com pessoas de todas as classes sociais, com malandro e com bandido e com polícia, com trabalhadores e vagabundos, com acadêmicos e analfabetos. Ali, dentro de campo, com a mesma camisa, todos são iguais... Não há pose nem badalação. É um jogo de futebol. Inevitavelmente, 99% dos campos varzeanos têm um bar para, após o jogo, aquela cerveja gelada e um bom jogo de truco.
Mas como nem tudo são flores, a várzea vem, ano após ano, acabando. As pseudo-escolinhas de futebol (futebol não se aprende, porra!) e os societys espalhados como praga por todos os lados ajudam a acabar mais rapidamente com essa tradição tão característica, que na iminência do fim já se faz anunciar. Este infelizmente é um processo irreversível. Muitos campos já foram tomados pela prefeitura principalmente para programas duvidosos de moradia popular e esquisitas construções de empresas. Mas nós, no Anhanguera, ainda não seremos enterrados por essa avalanche, pois estamos nos adequando às exigências imperativas da prefeitura de uma sociabilidade mascarada em relação à comunidade (não entrarei em detalhes)...
É com uma mistura de tristeza e não-conformismo que recebi a notícia de que a aeronáutica irá “desapropriar” os cinco clubes (Pitangueira, Baruel, Paulista, Saad e Cruz da Esperança) que atualmente (desde 1.980) têm a concessão de uso de seu território. Ainda ninguém sabe se esta notícia é especulação ou não.
Aquele pedaço, no bairro da Casa Verde, talvez seja hoje (e digo talvez porque não conheço outro) o maior aglomerado de campos da várzea paulistana num mesmo espaço. São cinco campos independentes, um ao lado do outro, bem como era antigamente, com suas rivalidades e boa convivência. Eu, assim como os bons freqüentadores dos campos, já corri muito por lá, naqueles gramados.
Digo, em nome de minha pessoa, aos amigos da Casa Verde que ficarão órfãos de seus clubes e campos: Atravessem o rio Tietê e sejam bem chegados pra uma cerveja no Anhanguera. Pra jogar bola é outra história...
3 Comentários:
É Cabra...deprimente. Ainda digo mais, não é só com um campo que eles acabam, eles acabam com todo uma história, um bairro....
Imagina, ficar sem o campo de domingo ? Mamãe..que merda !!!!
Forza várzea. Vc não pode acabar !!!!
É Kid...
sem nenhum comentario...
apenas assino embaixo do que você escreveu!!!
Triste mesmo a notícia...
São Paulo tá virando terra-de-ninguém. Não tem mais cara, não tem mais história, não tem mais tradição.
É a casa da mãe Joana, versão 10.000.000 de cômodos...
:P
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