Corinthians X Palmeiras
Há um jogo entre Palmeiras e Corinthians que não consta nos dados oficiais e nem teve a repercussão merecida; um dos grandes jogos da história do clássico. Poderia até ter saído uma nota no finado diário A Gazeta Esportiva, quando o futebol amador ainda era vitrine para clubes grandes e craques despontavam nas peladas. Isso mesmo; foi um jogo de várzea. E como nessas águas eu remo com um remo só - modéstia às favas -, vou relatar aqui este que foi um jogaço. Muito embora esquisito, foi um jogaço.
Em meados dos anos 50, num domingo de manhã num campo na Mooca, jogaram Corinthians do Bom Retiro e Palmeiras da Penha. Não só nos nomes esses times homenageavam os dois maiores da cidade. As cores, o uniforme, o símbolo, enfim, tudo remetia aos grandes. Abundavam pela cidade times assim. Se Portuguesa havia mais de 20, imaginem Palmeiras e Corinthians!
No jogo em questão havia, entretanto, um porém. O Bom Retiro de baixo (da Rua Sólon até a Marginal), onde ficava a sede do Corintinha, na época, era predominado por italianos que, obviamente, eram palmeirenses – até hoje os velhos se denominam palestrinos. A Penha também era um bairro essencialmente italiano, mas a partir da década de 40 a grande maioria dos migrantes nordestinos se alocou ali - da região do Brás pra dentro da Zona Leste -, além dos negros que estavam sendo afastados da região central. Com o preconceito sofrido pelos carcamanos, os “baianos”, em sua maioria, preferiram o Corinthians.
O fato de um corinthiano torcer pelo Palmeiras da Penha, o time do seu bairro, possivelmente até de sua rua, não justificava vergar a camisa alviverde; exceção restrita aos jogadores. No caso dos palmeirenses do Bom Retiro, idem. Vestir alvinegro, jamais! A várzea vivia então seus tempos áureos, os bairros eram representados pelos seus times e as torcidas eram fanáticas. Quando o jogo era entre times de bairros distintos todo mundo ia torcer. Neste dia, por exemplo, muita gente que era Anhangüera, Nacional, Junqueira, Marconi, Bola Preta, XV de Novembro, Grajaú, etc., foi torcer pelo Corintinha; afinal de contas, além de seus amigos estarem em campo, não se costumava perder grandes jogos, como tal.
O que se viu foi uma desordem generalizada e sem precedentes. No dia do prélio, mais de 1.000 expectadores, dizem os relatos, lotaram o campo da Mooca. A turma do Bom Retiro foi em peso torcer para o Corintinha e o pessoal da Penha para o Palmeirinha. Tudo normal, não fosse pelo jogo que aconteceria a tarde no Pacaembu pelo Campeonato Paulista: Corinthians e Palmeiras. Muita gente sairia da Mooca direto pra o estádio municipal. Foi isso que causou a confusão; na torcida do Corintinha predominavam torcedores com camisa do Palmeiras e na torcida do Palmeirinha as camisas do Timão eram maioria.
O Corintinha fazia um gol, os palmeirenses comemoravam; e vice-versa. Os jogadores, totalmente atordoados, não sabiam com que torcida comemorar. Um jogador do Palmeirinha foi pro alambrado comemorar com a torcida "palmeirense" e levou uma cusparada na cara. A cena pitoresca justificou o ditado de que a banana estava comendo o macaco. Na mesa de jogo de sueca, os velhos sempre quietos, ranzinzas, riam achando tudo aquilo engraçado. A mulher do português que arrendava o bar do clube desistiu de vez de entender alguma coisa sobre o futebol. Um bêbado tentou invadir o campo e “destrocar” as camisas dos jogadores; pregava, austero, que “ainda não acabou o jogo. Por que já trocaram as camisas?”.
Após mais de 50 anos não existem mais registros do prélio, somente depoimentos das testemunhas. A única certeza é que o jogo terminou 3 a 2. O problema é que não se sabe mais pra quem, uns dizem que foi o Palmeirinha, outros dizem o contrário. É certo que a confusão das camisas nas torcidas confundiu as memórias no Tempo. Pra mim, meus caros, o resultado da partida foi o único da história a contrariar a impossibilidade; o que se deu foi uma retumbante vitória de Corinthians e Palmeiras.
Em meados dos anos 50, num domingo de manhã num campo na Mooca, jogaram Corinthians do Bom Retiro e Palmeiras da Penha. Não só nos nomes esses times homenageavam os dois maiores da cidade. As cores, o uniforme, o símbolo, enfim, tudo remetia aos grandes. Abundavam pela cidade times assim. Se Portuguesa havia mais de 20, imaginem Palmeiras e Corinthians!
No jogo em questão havia, entretanto, um porém. O Bom Retiro de baixo (da Rua Sólon até a Marginal), onde ficava a sede do Corintinha, na época, era predominado por italianos que, obviamente, eram palmeirenses – até hoje os velhos se denominam palestrinos. A Penha também era um bairro essencialmente italiano, mas a partir da década de 40 a grande maioria dos migrantes nordestinos se alocou ali - da região do Brás pra dentro da Zona Leste -, além dos negros que estavam sendo afastados da região central. Com o preconceito sofrido pelos carcamanos, os “baianos”, em sua maioria, preferiram o Corinthians.
O fato de um corinthiano torcer pelo Palmeiras da Penha, o time do seu bairro, possivelmente até de sua rua, não justificava vergar a camisa alviverde; exceção restrita aos jogadores. No caso dos palmeirenses do Bom Retiro, idem. Vestir alvinegro, jamais! A várzea vivia então seus tempos áureos, os bairros eram representados pelos seus times e as torcidas eram fanáticas. Quando o jogo era entre times de bairros distintos todo mundo ia torcer. Neste dia, por exemplo, muita gente que era Anhangüera, Nacional, Junqueira, Marconi, Bola Preta, XV de Novembro, Grajaú, etc., foi torcer pelo Corintinha; afinal de contas, além de seus amigos estarem em campo, não se costumava perder grandes jogos, como tal.
O que se viu foi uma desordem generalizada e sem precedentes. No dia do prélio, mais de 1.000 expectadores, dizem os relatos, lotaram o campo da Mooca. A turma do Bom Retiro foi em peso torcer para o Corintinha e o pessoal da Penha para o Palmeirinha. Tudo normal, não fosse pelo jogo que aconteceria a tarde no Pacaembu pelo Campeonato Paulista: Corinthians e Palmeiras. Muita gente sairia da Mooca direto pra o estádio municipal. Foi isso que causou a confusão; na torcida do Corintinha predominavam torcedores com camisa do Palmeiras e na torcida do Palmeirinha as camisas do Timão eram maioria.
O Corintinha fazia um gol, os palmeirenses comemoravam; e vice-versa. Os jogadores, totalmente atordoados, não sabiam com que torcida comemorar. Um jogador do Palmeirinha foi pro alambrado comemorar com a torcida "palmeirense" e levou uma cusparada na cara. A cena pitoresca justificou o ditado de que a banana estava comendo o macaco. Na mesa de jogo de sueca, os velhos sempre quietos, ranzinzas, riam achando tudo aquilo engraçado. A mulher do português que arrendava o bar do clube desistiu de vez de entender alguma coisa sobre o futebol. Um bêbado tentou invadir o campo e “destrocar” as camisas dos jogadores; pregava, austero, que “ainda não acabou o jogo. Por que já trocaram as camisas?”.
Após mais de 50 anos não existem mais registros do prélio, somente depoimentos das testemunhas. A única certeza é que o jogo terminou 3 a 2. O problema é que não se sabe mais pra quem, uns dizem que foi o Palmeirinha, outros dizem o contrário. É certo que a confusão das camisas nas torcidas confundiu as memórias no Tempo. Pra mim, meus caros, o resultado da partida foi o único da história a contrariar a impossibilidade; o que se deu foi uma retumbante vitória de Corinthians e Palmeiras.
23 Comentários:
Ótima história. A questão do placar, 3 x 2 não se sabe pra quem, me faz lembrar uma das grandes frases que alguém já escreveu pra um samba: ' eu atirei, ele atirou e nós trocamos tanto tiro que até hoje ninguém sabe quem morreu. Eu garanto que foi ele, ele garante que fui eu"
Grande Júlio, verdade. É isso mesmo. Este samba é o famoso O Rei do Gatilho, gravado pelo célebre Moreira da Silva. Composição - não poderia não ser - de Miguel Gustavo.
Abração!
Mano velho, este é um dos melhores textos sobre futebol que li em toda a minha vida...
Trata-se do maior clássico do mundo, que se espalha por todo o canto e dá origem a grandes histórias.
Abraço!
Que aula de várzea !!!
Deve ter sido no mínimo engraçada a situaçao ... hahahahha
e da-lhe Palestra !!!
abraços !!!
Muito bom Arthur ...
Mas não duvido muito dessa vitória ter sido alvi-verde !!
hehe ...
Beijo
Eu lembro....
deu corintinhaa!!
uhahuahuahuhuahua
Caro, fantástico este post. A Várzea do futebol de verdade deve ser reverenciada sempre, e aqui se faz isso como em nenhum lugar. Parabéns.
Tomei a liberdade de adicionar seu blog em meus favoritos.
Sou cúmplice de Arquibancada do Japonês, este logo acima.
Saudações Corinthianas.
Filipe: a várzea é minha escola. Sou nascido e criado nas peladas. O time em que jogo, o Anhangüera, já teve meu pai e meu avô como capitães do 1º quadro. Essa é a minha bandeira. Estão querendo acabar com nossa caríssima tradição varzeana, mas estamos na luta.
Esteja em casa.
Abraço e saudações corithianas!
Srs, o maior clássico do mundo...os BAMBIS morrem de inveja..até na várzea é assim, eu não conheço muito time SP na várzea, mas Palmeiras e Corinthians tem de monte.
O melhor de tudo é que sempre ganhamos...chupa CABRA !!!
Angelo
Deu palestra nesse embate, certeza.
Belo texto, Arthur!
Un bacio, amico mio!
História fantástica. Aqui no Rio tivemos também uma proliferação de "inhos" (antes daqueles policiais corruptos ligados ao delegado Álvaro Lins) que nem o Google registra (procurei em vão). Times de subúrbios, várzeas e alçapões cujas histórias se perderam. Favela, escreve um livro sobre futebol de várzea e marca o lançamento nacional na Folha Seca, porra!
Concordo com o Zé Sérgio, o caldo tá escapando pelas beiradas...tá mais do que na hora de vc dar uma engrossada nos magros escritos sobre a várzea. Só que o lançamento nacional deve ser no Anhanguera, depois pode ir pro Folha Seca.
beijos
Isso aí, Milena.
Corinthians x Palmeiras é o jogo mais importante da terra. Nada se compara. Um são paulino jamai saberá o que é isso....
Certa feita eu estava de carro num dia de jogo e parei no sinal. Do meu lado um taxista de janela aberta me deu uma olhadela e voltou a olhar pra frente. Eu olhei pra ele, e voltamos a olhar pra frente. Fez-se um silêncio constrangedor. De repente, ele não se conteve e disse, contrito:
- é hoje!
E eu repeti:
- é hoje!
O sinal abriu, eu parti e ele também. Não falamos explicitamente do jogo, nem eu nem ele estávamos uniformizados, mas estávamos consumidos pela mesma expectativa, aquela sensação quase insuportável que antecede o jogo.
É o maior jogo do planeta.
Zé Sérgio: Porra, ainda tem muita coisa pela frente, tenho que desbravar demais. Por enquanto vou devagar, escutando os causos, observando mais que falando e deixando aqui essas pérolas.
Julio Vellozo: mano, esta passagem sintetiza o que é o clássico.
Aos que disseram que quem venceu este jogo foi Corinthians ou Palmeiras, repito: a vitória foi - a única da história - dos dois!
BOM OQ TENHO A DIZER É Q ESSAS COISAS SÓ ACONTECEM NESSES BAIRROS BARRA FUNDA E BOM RETIRO É UMA COISA DE LOKO. BELO TEXTO FAVELA...
Passe a fazer disso - o livro - , então, um objetivo, mano. Você está cada vez melhor, lê-lo está mais prazeroso a cada dia, as histórias estão mais hilárias que nunca. O futebol e o povo estão umbilicalmente ligados, e esse momento em que o futebol profissional se afasta definitivamente desse povo, é o momento para ideal para o aparecimento de um livro como esse que nossa madrinha sugeriu. Seja você o autor, malandro! Mãos à obra! Beijo.
Maravilha!
Meu compadre, conte com a Folha Seca não só para um eventual lançamento, mas também na hora de editar o livro. Estamos aí!
Vamos repetir a cervejinha qualquer dia desses, no Anhangüera ou no Rio-Brasília.
Abraço,
Digão
Edu: essa é uma das missões mais importantes - e necessárias! - no atual cenário. E ser o indicado por figuras maiúsculas como Zé Sérgio e Eduardo Goldenberg para tal é muita honra pra mim. Estou garimpando muita coisa, mano. Minha única pretensão é fazer com que algumas histórias não se percam. Mas vamos ver onde vai dar tudo isso, né não?
Beijão.
Digão: Se a coisa trilhar este caminho, não tenha dúvidas. Quanto à cervejinha, te aguardo no Anhangüera! Só avise quando vier.
Abraço!
Parabéns pela crônica... linda mesmo!
Que legal é a historia desse classico !!
sabemos que por isso as Madames do Jd. Leonor tem tanto siumes da gente...
e o nosso total desprezo para com a garota JuJu
Saudaçoes Palestrinas !
É por isso que digo: Arthur Tirone, um dos grandes! Que o Anhanguera dos campos e dos sambas seja eterno!
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