O pé de valsa e o pugilista
Parte II - Capoeira, Bagunça e o desfecho
Carlinhos já tinha feito coisa similar com outros, sempre com homens que julgava serem respeitados, independendo se o fulano é de briga, ou se quer briga; coisa de maluco. Se garantia nas mumunhas do boxe, e era bom de pancada. É o tipo que, pra não ficar por baixo, cisma que vai dar um cacete “naquele cara que está todo prosa”. O Paulinho fazia sucesso com o mulherio. Pra Carlinhos ficar no mesmo nível tinha que bater; e ameaçou até conseguir a briga. Mas Paulinho Pernalonga não era nenhum trouxa, muito pelo contrário. Fora criado na tiririca, no samba, na rua. Era grande amigo de Hélio Bagunça, andavam juntos – e o Carlinhos só mexeu com ele porque também conhecia o Bagunça, embora não fossem camaradas. Por viver na tiririca ficou bom de pernada. E sua anatomia ajudava, de longe ele podia acertar o pé no inimigo.
Naquela época o Hélio Bagunça era o chefe de uma ala extinta na Escola, a ala da capoeira. A verde e branco saia na São João com essa ala, os capoeiristas voando, chutando, pulando. Num desses carnavais, inclusive, Hélio foi protagonista de uma cena que ficou famosa. A justa armou um esquema para pegá-lo, não haveria jeito de escapar. Quando foram chegando perto, amocambados, o Bagunça percebeu. Com o desfile rolando, o malandro tacou a mão no chão, deu duas piruetas, pulou por cima de três foliões e da corda – coisa de dois, três metros - e sumiu. Os “homi” nunca o pegaram.
A ala fazia sucesso e muito neguinho queria entrar. Hélio percebeu aí um filão, a chance de ganhar uns trocos. Abriu uma escola de capoeira junto com o Pernalonga, ali perto da faculdade Osvaldo Cruz. Em pouco tempo a escola tinha um monte de alunos, os pretos da escola de samba e os brancos da faculdade. Só tinha um problema: nem Hélio nem Paulinho eram capoeiristas. Eles pulavam, chutavam, davam rasteira e faziam todo tipo de acrobacia, mas nem imaginavam o que era um martelo, um morcego ou ponta de faca. Não tinham técnica nenhuma e, por isso, Hélio resolveu adotar uma didática nada convencional: dar porrada nos alunos. Paulinho estranhou, no começo não gostou, mas acabou cedendo aos argumentos do Bagunça de que “Porra, nós aprendemos apanhando na rua, então nossos alunos vão aprender é apanhando!”. As aulas eram grandiosos quebra paus, com muita gente voltando avariada pra casa. A tresloucada academia de capoeira, que pelo menos não admitia mulheres, durou cerca de um mês.
Na fatídica noite em que Carlinhos arrebentaria Paulinho, o velho Inocêncio estava no salão. Eram duas em ponto, horário da inspeção do velho. Pernalonga, não agüentando mais as provocações, ponderou que brigassem, mas lá fora, na rua, porque lá dentro estava o velho. Paulinho, ainda dentro do salão, disse a Carlinhos que brigaria de igual para igual, na mão, do jeito do Carlinhos, e finalizou a negociação assim: “Se eu apanhar, brigando na mão, eu te mato na pernada! Vai indo pra fora que eu já vou”. E foram para a rua, os dois. Foram sós, sem alarde, sem assistência, sem aposta, sem glórias para o vencedor. Não deu quinze minutos e o Pernalonga adentra o salão com a mesma ginga, tranqüilamente empunhando uma cerveja. Quem sabia que ele fora brigar perguntou o que houve. Paulinho disse que Carlinhos não estava na rua, que havia ido embora. Vai entender!
Era o bom malandro, o Paulinho. Dois dias depois, Carlinhos apareceu na área de óculos escuros e para os mais chegados confessou que apanhou, e na mão. Se tivesse sido na pernada estaria morto, conforme a promessa de Paulinho. Na intenção de se vingar publicamente de uma surra que levara na surdina, Carlinhos planejou revidar na pernada, o ponto forte do Paulinho. Pediu para quem ensiná-lo a arte da ginga preta? O Bagunça. Hélio Bagunça, que soube da história à boca pequena e que não aceitava vacilação, aceitou. Pediu um valor alto, Carlinhos juntou suas economias e pagou. Bagunça, compadre de Paulinho Pernalonga, ensinou capoeira ao Carlinhos ao seu modo, numa única aula. O pugilista quase que ficou aleijado...
(Final)
Carlinhos já tinha feito coisa similar com outros, sempre com homens que julgava serem respeitados, independendo se o fulano é de briga, ou se quer briga; coisa de maluco. Se garantia nas mumunhas do boxe, e era bom de pancada. É o tipo que, pra não ficar por baixo, cisma que vai dar um cacete “naquele cara que está todo prosa”. O Paulinho fazia sucesso com o mulherio. Pra Carlinhos ficar no mesmo nível tinha que bater; e ameaçou até conseguir a briga. Mas Paulinho Pernalonga não era nenhum trouxa, muito pelo contrário. Fora criado na tiririca, no samba, na rua. Era grande amigo de Hélio Bagunça, andavam juntos – e o Carlinhos só mexeu com ele porque também conhecia o Bagunça, embora não fossem camaradas. Por viver na tiririca ficou bom de pernada. E sua anatomia ajudava, de longe ele podia acertar o pé no inimigo.
Naquela época o Hélio Bagunça era o chefe de uma ala extinta na Escola, a ala da capoeira. A verde e branco saia na São João com essa ala, os capoeiristas voando, chutando, pulando. Num desses carnavais, inclusive, Hélio foi protagonista de uma cena que ficou famosa. A justa armou um esquema para pegá-lo, não haveria jeito de escapar. Quando foram chegando perto, amocambados, o Bagunça percebeu. Com o desfile rolando, o malandro tacou a mão no chão, deu duas piruetas, pulou por cima de três foliões e da corda – coisa de dois, três metros - e sumiu. Os “homi” nunca o pegaram.
A ala fazia sucesso e muito neguinho queria entrar. Hélio percebeu aí um filão, a chance de ganhar uns trocos. Abriu uma escola de capoeira junto com o Pernalonga, ali perto da faculdade Osvaldo Cruz. Em pouco tempo a escola tinha um monte de alunos, os pretos da escola de samba e os brancos da faculdade. Só tinha um problema: nem Hélio nem Paulinho eram capoeiristas. Eles pulavam, chutavam, davam rasteira e faziam todo tipo de acrobacia, mas nem imaginavam o que era um martelo, um morcego ou ponta de faca. Não tinham técnica nenhuma e, por isso, Hélio resolveu adotar uma didática nada convencional: dar porrada nos alunos. Paulinho estranhou, no começo não gostou, mas acabou cedendo aos argumentos do Bagunça de que “Porra, nós aprendemos apanhando na rua, então nossos alunos vão aprender é apanhando!”. As aulas eram grandiosos quebra paus, com muita gente voltando avariada pra casa. A tresloucada academia de capoeira, que pelo menos não admitia mulheres, durou cerca de um mês.
Na fatídica noite em que Carlinhos arrebentaria Paulinho, o velho Inocêncio estava no salão. Eram duas em ponto, horário da inspeção do velho. Pernalonga, não agüentando mais as provocações, ponderou que brigassem, mas lá fora, na rua, porque lá dentro estava o velho. Paulinho, ainda dentro do salão, disse a Carlinhos que brigaria de igual para igual, na mão, do jeito do Carlinhos, e finalizou a negociação assim: “Se eu apanhar, brigando na mão, eu te mato na pernada! Vai indo pra fora que eu já vou”. E foram para a rua, os dois. Foram sós, sem alarde, sem assistência, sem aposta, sem glórias para o vencedor. Não deu quinze minutos e o Pernalonga adentra o salão com a mesma ginga, tranqüilamente empunhando uma cerveja. Quem sabia que ele fora brigar perguntou o que houve. Paulinho disse que Carlinhos não estava na rua, que havia ido embora. Vai entender!
Era o bom malandro, o Paulinho. Dois dias depois, Carlinhos apareceu na área de óculos escuros e para os mais chegados confessou que apanhou, e na mão. Se tivesse sido na pernada estaria morto, conforme a promessa de Paulinho. Na intenção de se vingar publicamente de uma surra que levara na surdina, Carlinhos planejou revidar na pernada, o ponto forte do Paulinho. Pediu para quem ensiná-lo a arte da ginga preta? O Bagunça. Hélio Bagunça, que soube da história à boca pequena e que não aceitava vacilação, aceitou. Pediu um valor alto, Carlinhos juntou suas economias e pagou. Bagunça, compadre de Paulinho Pernalonga, ensinou capoeira ao Carlinhos ao seu modo, numa única aula. O pugilista quase que ficou aleijado...
(Final)
4 Comentários:
Fala Arthur
Muito boa sua história
Oq eu mais gostei foram os métodos de ensino na escola de capoeira
hauauahuhuahuahuahuahauhahaha
Muito bom
Abraço
Ava
hahahahahaha
Sensacional !!
abraços
Avary, preciso te apresentar a Olga...
heheheheheh ...
Sempre arrasando né ?
Muito bom, adorei !!
ahhahaha ...
Beijo
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