17 de fev. de 2009

O guardião da Bocha

As origens do jogo de bocha são controversas. Alguns dizem que é um dos jogos mais antigos do mundo, tendo indícios no Egito e Grécia antiga. Mas a que mais tem valia é a de que os italianos são os pais da criança. Nasceu lá a primeira federação e o primeiro campeonato.

No Brasil, a bocha chega justamente com os imigrantes italianos; por isso a forte presença nas regiões sul, São Paulo e sul de Minas. No começo do século passado, era praticada apenas em festas religiosas dos imigrantes, mas com a institucionalização do esporte na Argentina na década de 30, a bocha passou a ser o segundo esporte no Rio Grande do Sul e se alastrou ainda mais.

As regras oficiais são simples. O negócio, o gol da bocha, é lançar a boccia (são quatro bolas de resina sintética, com mais ou menos um quilo, para cada equipe) de modo que se aproxime o máximo possível do bolim – ou balim -, a bolinha pequena. O time que se aproximar mais ganha o ponto – pode-se também jogar individualmente, um contra um.

Até a década de 50, no entanto, jogava-se no Brasil o uma variação do esporte, o “ponto-e-bota”; uma bocha, digamos, mais rústica. Enquanto na bocha há uma certa delicadeza no arremessar, inclusive nos tiros para retirar a bola adversária de perto do bolim, no ponto-e-bota o a bola não rola, ela estanca. Pudera, a boccia era um melão de madeira de quatro quilos. O ponto consiste em arremessar a bola para que ela estanque perto do bolim. A bota é que era o fino; essa jogada consiste em jogar a pesada bola de madeira de modo que ela caia sobre a outra – dir-se-ia “na orelha” da outra -, tirando a bola inimiga do lugar, onde fica, ela, estancada. Uma jogada para poucos!

Em São Paulo, o ponto-e-bota foi febre até os anos cinqüenta. Depois disso acabou se dissolvendo com a implementação dos campeonatos oficiais de bocha. Jogava-se adoidado nos clubes grandes, pequenos, nos quintais das casas e em outros terrenos improvisados. Há relatos que na Rua Cruzeiro chegaram a invadir o grande galinheiro da casa do Seu Nilo para jogar. Resultado do embate: três galinhas espatifadas.

Apesar de os campeonatos manterem-se firmes e fortes, a febre pela bocha foi diminuindo ao longo do tempo e, há anos, é considerado um esporte geriátrico, para velhos caquéticos. Falo, logicamente, sob a perspectiva de quem vê não num longo alcance geométrico, estatístico ou mesmo oficial, mas com a profundidade de quem vive o cotidiano do bairro e dos clubes do bairro. A cancha de bocha era presente em quase todos os clubes varzeanos. Hoje, aqui na região, temos a do Anhangüera e a do Paulista da Casa Verde, nesses redutos brejeiros, desligados das oficialidades e dos calendários bocheiros. Onde aqueles que viveram o auge do esporte mantêm o costume.

No Anhangüera tivemos grandes jogadores, capitaneados pelo Durão. Nas décadas de 70 e 80, nossa cancha lotava aos sábados e domingos; de jogadores e de assistência e nossa equipe (na foto abaixo) levantava canecos à rodo, fazia excursões e dava shows de deixar os Globetrotters no chinelo. Hoje, após uma década com poucos gatos pingados e raros velhinhos que sobreviveram e apareciam de vez em quando, quando as restrições do tempo lhes davam uma trégua ou outra, estamos vivendo uma fase nova, com novos campeonatos regionais e a recuperação do gosto pela bocha. E graças a uma pessoa, em especial.



Em 1986, na cancha do Anhangüera.

Excursão em 1983 para Santos.



Outro dia, num samba no Anhangüera sob a batuta dos Inimigos do Batente, coloquei sobre a mesa no meio da roda o último troféu que o Anhangüera logrou; um troféu de bocha, trazido pelas mãos de Roberto Scaranello, o Beto, um homem que vem sendo, nos últimos anos, o elo que nos liga aos velhinhos da foto aí de cima, que tanto honraram nossas cores. Um incansável não somente no que se refere à bocha, mas às relações amistosas e fraternas que o esporte sempre proporcionou. Um homem que conhece o valor de uma tradição. Um homem de paz.


Ano passado na cancha do Anhangüera. Beto é o de vermelho.

4 Comentários:

Blogger Felipe Quintans disse...

Que maravilha de fotos, Favela, demais mesmo. Já estou com saudades do clube, dia 03 estou aí e quero ver a cancha de bocha novamente.

Beijo, meu velho.

18 de fevereiro de 2009 às 08:49  
Anonymous Anônimo disse...

Opa!

Cara, jogo no Autônomos FC, jogamos contra vocês duas vezes. Sou também pesquisador do futebol de várzea e preciso dizer que acho o Anhangüera fantástico! E o blog muito bom...

Se der, visite meus blogs:

http://vailateral.wordpress.com
http://manihot.wordpress.com

Abraços,

Kadj Oman.

18 de fevereiro de 2009 às 19:53  
Anonymous Anônimo disse...

Bom texto Cabra..boas lembranças e homenagem merecida ao Bob.

Vai Anhanguera !!!!

Bj

Angelo Tirone

19 de fevereiro de 2009 às 18:56  
Anonymous Anônimo disse...

Arthur, parabens mais uma vez pelo
texto, realmente o Beto, hoje em dia,
é a pessoa certa para impulsionar o Departamento de Boccia,,Valeu,
Papai.

20 de fevereiro de 2009 às 16:50  

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