9 de jan. de 2008

Sou mais os treineiros

Alguns treinadores de futebol acabam chamando a atenção da assistência e dos jornais mais que a maioria dos jogadores. Seja pela capacidade estratégica, pela sorte, pela irreverência, carisma ou qualquer outra coisa. O fato é que algumas figuras marcam época e cada um destaca-se pela qualidade mais marcante e inusitada de lidar com situações e pessoas. Hoje eles ocupam desmedido espaço em programas televisivos, alcançam status de guru, dão palestras de auto-ajuda do tipo “Seja um vencedor!”, recebem salários estratosféricos e participam do gerenciamento do departamento de futebol, dos lucros na compra e venda de atletas, entre outras regalias. Esses troços vêm de alguns anos pra cá, desde que a filosofia de futebol-empresa é quase unanimidade entre jornalistas e torcedores.

Uma prática comum dos grandes clubes é a de enviar à várzea gente conhecedora de futebol que tenha sensibilidade para descobrir novos talentos, os famosos olheiros. Eu poderia citar uma porrada de craque que veio da várzea e das peladas de bairro, mas neste texto vou expor meu inconformismo; os profissionais do futebol não sabem que cometem uma exorbitante injustiça com os treinadores varzeanos, os populares treineiros. Eu vi (e ouvi relatos), na várzea, os melhores treinadores do Brasil. Não tenho dúvidas.

Plínio foi treineiro do Anhanguera durante a década de 40. O maior estrategista da várzea. Visionário de maior quilate. Dizem que Vanderlei Luxemburgo, com toda sua marra de gênio, levaria um indecoroso nó tático no embate direto com o Plínio. Um dia, pesquisando algumas súmulas da época, percebi que o Tonel, grande alfo-direito que defendeu o rubro negro da Barra Funda, marcou 7 tentos em 1942. Nota-se que, antes mesmo de os melhores laterais do mundo, os Santos Djalma e Nilton, o último apelidado de Enciclopédia, causarem furor ao ultrapassar a linha média, o Tonel já corria pro abraço.

Alex Ferguson é técnico do Manchester United, da Inglaterra (não pensem que explicar que o time é inglês é desnecessário, pois na várzea paulistana, assim como Vai Quem Qué, Sapeco Futebol e Samba, Vâmo que Vâmo, Vida Lôka e É Nóis na Fita, tem times como Ajax, Arsenal, Milan, Celtic, River Plate, entre outros), e o mundo inteiro o exalta por estar há 23 anos no comando da equipe. Aceito que ele merece reconhecimento, mas deixo registrado que o Zózimo do Nacional do Bom Retiro permaneceu por inabaláveis 31 anos à beira do gramado.

Emerson Leão, afamado por ser linha dura com seus subordinados, perto de Hércules, do Guarany do Brás, não passa de um gato siamês. Um bichano. Hércules, ao final dos jogos, enfiava a mão em jogador que jogasse mal ou pior ainda, que tirasse o pé em jogadas desleais. No quesito reclamar com o juiz Leão também é considerado o maior. Declaro que o Hércules desmaiou na porrada mais de 20 árbitros e o Zé Bocão, do Classe A, simplesmente mandou trocar mais de 100 durante os jogos por estarem, segundo ele, prejudicando seu time.

Luiz Felipe Scolari é querido por seus atletas por ser paizão e por transformar qualquer time que treine na chamada “Família Scolari”. O Moisés, atual técnico do primeiro do Anhanguera, um dos maiores corações de que se tem notícia, já “adotou” 26 jogadores que passaram em suas mãos. Na Casa Verde o Moisés, um negrão de 58, é querido demais e adorado pela malandragem justamente por contribuir com a formação de tanta criança que vive a esmo. O Scolari perto do Moisés é um padrasto ruim.

Oswaldo de Oliveira é sereno e tenta motivar seus jogadores com conversas junto a psicólogas e com nutricionistas especializadas em alimentos e suplementos que contenham substâncias saudáveis. O Rei, do extinto time de função Poder Negro, chefe de bocada, motivava os atletas com cerveja, pó e putas. O Poder Negro deteve a impressionante invencibilidade de 12 anos sem perder um jogo. E jogando só fora de casa! Talvez se as psicólogas e nutricionistas que o Oswaldo de Oliveira contrata tivessem relações mais íntimas com os marmanjos, a carreira dele teria sido menos bisonha.

Somente do Anhanguera eu poderia citar vários outros, como o japonês Tottio, que durante 8 anos como treineiro jamais deu sequer uma instrução pra jogador nenhum. Tomaselli, que em 7 anos perdeu míseros quatro jogos. Walter era chamado de “pulso firme” por ser mandado e desmandado e mesmo assim teve a sorte de permanecer bons tempos invicto. Daniel – ele, o Gordo – jamais dirigiu o time sóbrio e inclusive oferece cachaça pra patuléia ainda no vestiário antes dos jogos. O Dedé, que fazia mandingas mil e “assistia” aos jogos de costas...

Enfim, minha síntese é que, longe de toda a profissionalização, do marketing, de ternos de grife, psicólogos e palestras, num campo de várzea qualquer ainda vivem Carlito Rocha, Oswaldo Brandão e tantos outros treineiros...

11 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

Arthur você esqueceu de falar sobre o técnico do tio Wágner, que não me lembro o nome nem o time que era, mas ele passava suas instruções para os jogadores e a sua tática era a seguinte:-O goleiro pega tudo, a zaga não deixa passar nada, o meio-campo arma as jogadas e o ataque faz gol.
Quando dava certo...

Abraços

Bruno Tirone

9 de janeiro de 2008 às 12:47  
Anonymous Anônimo disse...

Excelente mano, excelente!!!

realmente a várzea tem grandes treineiros, em todos sentidos.

eu como um treineiro, não aceito jogador que não bebe, e quando não bebe é banco.

Bruno, acho que vou adotar essa tática, vou dar uma resumida nela e botar em campo!!!

abraço

9 de janeiro de 2008 às 15:28  
Blogger Craudio disse...

Favela, essa semana apareceu no Coringão uma máquina que detecta beberrões e corpo-moles... Garanto que todos os treineiros aí citados, só de longe, já sabiam que tava enrolando e quem tinha farreado antes do jogo.

O futebol perde, a cada dia, um pouco de sua magia. Hoje, técnico tem medo de jogador. Bons tempos em que se nego não corresse em campo, já ia pro vestiário esperando um sopapo no pé do ouvido do treinador.

Abraços!

9 de janeiro de 2008 às 15:41  
Anonymous Anônimo disse...

Arthur
A varzea é o melhor lugar que existe para jogar futebol do mundo
Pois depois do jogo sempre tem um bar do lado
E os tecnicos da varzea são as melhores figuras que existem no futebol
Pena que isso esta acabando, pois toda criança que nasce nos dias de hoje não jogam na varzea e sim em escolinhas
Abraço velho

9 de janeiro de 2008 às 16:34  
Anonymous Anônimo disse...

Lamento que a varzea hoje em dia não seja vitrine para lançamento de novos jogadores . Já que este palco nos faz lembrar com nostalgia os acontecimentos e jogadores de outrora.

Abraço

André

10 de janeiro de 2008 às 15:29  
Anonymous Anônimo disse...

Já que a arte futebolística pulou um galho da árvore genealógica da minha famíla ... meu filho será dirigido por Daniel, o Gordo !!!
E por falar em técnicos ... como este ano teremos apenas um embate de nossos gloriosos times, você irá ser testemunha de uma aula tática do mestre Luxa, certo Mano ???

abraços !!!

11 de janeiro de 2008 às 19:39  
Anonymous Anônimo disse...

Adorei as comparações Artur!!!!

Uma ótima semana!!!!!

Beijos

14 de janeiro de 2008 às 14:13  
Anonymous Anônimo disse...

melissa no comentário anterior

14 de janeiro de 2008 às 14:14  
Anonymous Anônimo disse...

Gordo... bora treinar o Santos!!!

15 de janeiro de 2008 às 15:25  
Anonymous Anônimo disse...

Só um comentário :

A várzea é magia, não há explicação, os verdadeiros jogadores nasceram lá e quando não jogam mais em seus clubes voltam para o berço, simplesmente porque gostam daquela magia.

Essa magia é contagiante...............

Um abraço a todos DEZ.

16 de janeiro de 2008 às 08:54  
Anonymous Abdias disse...

Tive a honra de jogar muitos anos na várzea, no bairro da Moóca. Fundei e joguei no Infantil São Bento e joguei no Juvenil Palestra, que era um timaço: Felo, Coelho e Didi; Bimba Nenê e Caipira; Baiano (o signatário)Berto, Quinho, Lorota e Fazenda. Chegamos a ganhar do Parque da Moóca. Os grandes da da Moóca eram: Niterói, Bairro Chinês, Madri.

1 de dezembro de 2012 às 13:24  

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